Por oito votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira que os mandatos pertencem aos partidos e que a infidelidade é uma hipótese para cassação de parlamentar. As legendas poderão, se desejarem, requerer diretamente à Presidência da Câmara as vagas dos deputados que migraram para outras siglas a partir do dia 27 de março. Foi nessa data que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se pronunciou sobre uma consulta do DEM e reconheceu que os partidos são os donos das vagas, e por isso seis ministros a adotaram como base para a validade da regra.
Os ministros também decidiram que o parlamentar terá amplo direito de defesa, antes de qualquer sentença de cassação. O rito processual deverá ser regulamentado por uma resolução do TSE e cada caso será julgado individualmente. O direito de defesa foi justificada pelos ministros como forma de proteger os casos excepcionais, em que a saída do partido se deu por motivo relevante, como a perseguição política ou a mudança de linha programática da legenda.
A decisão não tem caráter vinculante – ou seja, não obriga o cumprimento por toda a Justiça -, mas representa uma nova jurisprudência para o assunto, devendo nortear futuros julgamentos no Supremo e nos tribunais eleitorais. "Essa decisão é a necessária restauração do equilíbrio de forças entre as agremiações tal como saíram das urnas", disse a presidente do STF, ministra Ellen Gracie.
Na atual legislatura, 46 deputados mudaram de partido. Desses, 15 saíram após o dia 27 de março. Na quarta-feira (3), um deputado assinou a filiação em uma nova legenda, mas a mudança ainda aguarda oficialização da Câmara.
Recursos
O julgamento foi motivado pelo ajuizamento de mandados de segurança por PPS, DEM e PSDB, que em abril requisitaram à presidência da Câmara a declaração da perda de mandato de 23 deputados que saíram das legendas ao longo da atual legislatura. Na época, o presidente Arlindo Chinaglia negou a posse dos suplentes, alegando que não havia "direito líquido e certo", o que motivou o recurso dos partidos ao STF.
Para os três partidos, a vitória foi parcial. Com base nos mandados, o PSDB não poderá requerer de imediato nenhuma vaga, pois os sete deputados saíram da legenda antes de 27 de março. O mesmo vale para o PPS. No caso do DEM, a possibilidade é de reaver apenas um mandato – o da deputada Jusmari Oliveira (BA), que trocou a legenda pelo PR em abril.
"Mesmo que não seja o ideal, é uma decisão muito boa para as instituições. Não haverá mais barganhas do Executivo sobre os parlamentares", disse o presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), que acompanhou o julgamento.
O líder do PR na Câmara, deputado Luciano Castro (RR), disse que já está fazendo gestões junto ao Senado para que vote na próxima semana o Projeto de lei Complementar (PLP) 35/07, de sua autoria, que institui a fidelidade partidária. O texto, que foi aprovado em agosto na Câmara, anistia todos os parlamentares que trocaram de partido até 30 de setembro. O PR foi o partido que mais abrigou dissidentes.
O deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que também esteve no STF, afirmou que a decisão "assegura um avanço institucional", mas não exime o Congresso de legislar sobre o tema. Para ele, o novo entendimento deverá apressar a votação do PLP 35/07.
Argumentos
O principal argumento favorável foi de que o sistema político brasileiro consagra os partidos como elementos centrais para a eleição de um candidato. O ministro Celso de Mello, o primeiro a falar e cujo voto estabeleceu os rumos do debate, insistiu que o modelo eleitoral do País baseia-se em dois princípios de fidelidade: ao partido com o qual o candidato se elegeu e ao cidadão que lhe deu o voto. "Qualquer mudança significa fraudar o interesse do povo e lesar o modelo de democracia representativa", disse.
A ministra Ellen Gracie lembrou também que apenas 31 deputados conseguiram se eleger em 2006 com os votos pessoais obtidos. O restante precisou do coeficiente eleitoral, em que são juntados os votos recebidos pela legenda.
Os ministros que votaram contra a fidelidade argumentaram que a Constituição não estabelece a infidelidade entre as hipóteses de perda de mandato. "Não me parece adequado resolver a questão à luz de princípios supostamente existentes na Constituição", disse o ministro Joaquim Barbosa.
Reportagem – Janary Júnior
Edição – Marcos Rossi
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